domingo, 21 de junho de 2015

Exemplo de Questão sobre Escolas Literárias no Enem


Como vimos em nossa nova série de artigos sobre as escolas literárias luso-brasileiras, o Quinhentismo foi um movimento literário importante no início do século do descobrimento do Brasil. Para demonstrar a importância de estudar estes movimentos literários, selecionamos uma questão da edição 2013 do ENEM, resolvida pela professora Margarida dos Santos Marques Moraes, que possui graduação e mestrado em Letras pela Universidade de São Paulo.

ENEM 2013 – QUESTÃO 97
TEXTO I
Andaram na praia, quando saímos, oito ou dez deles; e daí a pouco começaram a vir mais. E parece-me que viriam, este dia, à praia, quatrocentos ou quatrocentos e cinquenta.
Alguns deles traziam arcos e flechas, que todos trocaram por carapuças ou por qualquer coisa que lhes davam. […] Andavam todos tão bem-dispostos, tão bem feitos e galantes com suas tinturas que muito agradavam.
TEXTO II
PORTINARI, C. O descobrimento do Brasil: 1956. Óleo sobre tela, 199 x 169 cm. Disponível em: www.portinari.org.br. Acesso em: 12 jun. 2013.
PORTINARI, C. O descobrimento do Brasil: 1956. Óleo sobre tela, 199 x 169 cm.
Disponível em: www.portinari.org.br. Acesso em: 12 jun. 2013.
Pertencentes ao patrimônio cultural brasileiro, a carta de Pero Vaz de Caminha e a obra de Portinari retratam a chegada dos portugueses ao Brasil. Da leitura dos textos, constata-se que
a) a carta de Pero Vaz de Caminha representa uma das primeiras manifestações artísticas dos portugueses em terras brasileiras e preocupa-se apenas com a estética literária.
b) a tela de Portinari retrata indígenas nus com corpos pintados, cuja grande significação é a afirmação da arte acadêmica brasileira e a contestação de uma linguagem moderna.
c) a carta, como testemunho histórico-político, mostra o olhar do ,colonizador sobre a gente da terra, e a pintura destaca, em primeiro plano, a inquietação dos nativos.
d) as duas produções, embora usem linguagens diferentes – verbal e não verbal -, cumprem a mesma função social e artística.
e) a pintura e a carta de Caminha são manifestações de grupos étnicos diferentes, produzidas em um mesmo momento histórico, retratando a colonização.

RESOLUÇÃO E COMENTÁRIO:
Alternativa C
Os dois textos, embora com linguagens distintas (verbal – que emprega palavras e não-verbal – que emprega imagens ou outros códigos), mostram a chegada dos colonizadores ao Brasil. A carta de Caminha é o primeiro documento a respeito dos indígenas e apresenta uma visão do homem dito ‘civilizado’ sobre os nativos, a partir da mentalidade europeia dos séculos XV-XVI. Já a pintura de Portinari, com um olhar mais crítico, apresenta a surpresa dos nativos em relação à chegada dos colonizadores.

infoEnem

Escolas Literárias Luso-Brasileiras – Quinhentismo



Nesta nova série de artigos iremos apresentar as escolas literárias luso-brasileiras, conteúdo cobrado no caderno de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias do Enem. Aconselhamos ao candidato conciliar os aspectos aqui tratados com seus conhecimentos de história e geografia. Inicialmente, devemos dizer que, pelo fato do Brasil ter sido colônia de Portugal até 1822, a produção literária até este período pode ser nomeada sob o rótulo de escolas luso-brasileiras, pois a dependência econômica e política para com a metrópole também condicionou-nos a imitação de aspectos culturais.
A primeira escola que trataremos será o Quinhentismo, que se iniciou com o descobrimento do Brasil e perdurou até o fim do século XVI. O contexto histórico desta escola abrange a expansão marítima europeia pelos continentes africano, asiático e americano. Conciliada à procura de novas colônias, a expansão requeria dos viajantes informações sobre as terras visitadas e os povos encontrados, em algo que se assemelharia, nos dias de hoje, a um relatório. Este tipo de relato descritivo geralmente informava sobre as condições de viagem, como informações cartográficas e aspectos relevantes para a metrópole, como recursos minerais encontrados, a fauna e a flora das terras descobertas.
O exemplo mais consagrado de obra deste período é a carta de Pero Vaz de Caminha, que viajou com Pedro Alvares Cabral, na qual há o relato para o Rei D. Manuel sobre a descoberta da “Terra da Vera Cruz”. Abaixo reproduzimos um excerto do texto original de Caminha, já adaptado para o português corrente.
E assim seguimos nosso caminho, por este mar, de longo, até que, terça-feira das Oitavas de Páscoa, que foram 21 dias de abril, estando da dita Ilha obra de 660 ou 670 léguas, segundo os pilotos diziam, topamos alguns sinais de terra, os quais eram muita quantidade de ervas compridas, a que os mareantes chamam botelho, assim como outras a que dão o nome de rabo-de-asno. E quarta-feira seguinte, pela manhã, topamos aves a que chamam fura-buxos.
Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome – o Monte Pascoal e à terra – a Terra da Vera Cruz.”
Fonte: Fundação Biblioteca Nacional, disponível em: http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/livros_eletronicos/carta.pdf.
Como características gerais da produção quinhentista, temos o emprego da linguagem erudita, clareza, ausência de figuras de linguagem e simplicidade. Esta carta irá marcar a construção do imaginário sobre os habitantes e as virtudes da terra, o que posteriormente se denominou nativismo, caracterizado pelo afeto e exaltação das características da colônia. Este fenômeno, embrionário ainda no Quinhentismo, terá desdobramentos e influenciará a produção barroca e do Arcadismo.
Outros autores relevantes do período são Pero de Magalhães Gândavo, Gabriel Soares de Sousa e Ambrósio Fernandes Brandão. Não poderíamos nos esquecer da produção dos missionários jesuítas que, motivados pela missão de civilizar os indígenas, produziram obras de caráter pedagógico e moralizante, como consta nos “Diálogos sobre a Conversão dos Gentios”. Este diálogo pode ser visto como uma justificativa da ação missionária, incentivando sua prática. Este texto formava parte da pedagogia empregada nos colégios jesuíticos para a formação de futuros padres.